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quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Artigo do Edson Vidigal: E línguas como que de fogo

Na região dos três santos, conhecida como do ABC paulista, o primeiro é Santo André. Entre nós pouco se sabe sobre esse senhor, o qual então jovem, após conviver com João Batista, aderiu ao Cristo.

André e seu irmão Pedro foram, dentre os discípulos, os que, talvez, mais assimilaram o legado do Cristo e daí reconhecidos como os mais influentes e ativos propagadores da fé cristã.

Mateus? Ah, Mateus, foi o grande repórter. Ninguém quanto ele contaria essa história tão bem, em textos tão claros.

O brutal assassinato do Cristo expos à história as vísceras de uma briga entre os que professavam ideias novas, sadias, ideias do bem e os que contra o Cristo temendo os novos tempos preferiam a comodidade sob os conformes dos antiquados e oligarcas.

Foi o Cristo ser arrancado fisicamente da cena e os irmãos Pedro e André, não deixando cair a peteca, adentrarem em novas jornadas por geografias sem mapas nem rascunhos, íngremes, onde só havia pagãos.

Enquanto Pedro, a quem o Cristo incumbira a fundação da Igreja, o que se deu em Roma, de onde ela pontifica vetusta, irradiante, soberana até hoje, coube a André correr o mundo em prédicas de evangelização.

Há mais de uma hora nessa viagem pelo tempo no Museu de História do Estado, em Moscou, sem guia oficial, mas com a Eurídice, indispensável na vida e na tradução, não me escapa, de um certo ponto de vista, o quanto a relação Igreja e Estado com o fluir do tempo foi se firmando em união de forças indissociáveis.

A história oral atravessadora dos tempos conta que André, quando nem de longe imaginaria ser o Santo Padroeiro da Rússia, passou com suas demandas de fé cristã por Cítia, Épiro, Acaia, Hélade, Capadócia, Galácia e Bitínia.

André pregou também em Capadócia, Galácia, Bitínia e Bizâncio, onde fundou a Igreja Cristã local e nomeou Eustáquio como Primeiro Bispo.

As Igrejas Cristãs se constituíam em bases autônomas sujeitas ao poder da fé e vínculos diretos apenas com as suas comunidades. Não tinham Papa.

Naquele tempo, como diriam os Evangelhos, em plena ignorância política e em total paganismo, o Poder dos Monarcas, à moda mais antiga dos gregos e dos romanos, reverenciavam os deuses que mandavam esculpir em pedra ou madeira.

Os deuses do Poderosos eram, portanto, os deuses do povo em geral, ignorante, servo e pagão. Essa manipulação de dominadores sobre dominados sempre houve. E quando se imagina ter se rompido um grilhão logo este se refaz e se fingindo de novo se ocupa em destilar novamente o mesmo veneno.

O cristianismo então, dispensando-se daqueles deuses do Olimpo grego e dos deuses do Templo romano, despontava da língua dos apóstolos e de seus seguidores como algo impossível de ser aceito, portanto, que matando literalmente os seus pregadores e seguidores seria possível abortar por atacado a sua viabilidade.

Mais tarde, a adesão do Império Romano ao cristianismo reativou a força do Estado deixando, na contrapartida, os cristãos em paz.

Todas as Igreja cristãs no mundo seguiam sendo uma só até que lá para tantas, no ano de 1054, os clérigos cristãos do Oriente, russos e gregos inclusos, pipocaram suas divergências com a autoridade do Papa, o Bispo de Roma.

As objeções azedaram as relações do Vaticano com as Igrejas do Oriente quando o Papa Leão IX mandou um Cardeal de Roma para chefiar os cristãos da Turquia.

Leão IX reagiu excomungando o líder dos protestos, o clérigo Miguel Cerulário, o qual, por sua vez, excomungou todos os católicos. De dentro pra fora ou de fora pra dentro.

(Faz lembrar o Luís Rocha, Governador do Maranhão, o qual entre uns desentendimentos com a Arquidiocese, foi ameaçado de excomunhão, disse que aquilo não era problema porque continuava católico e tinha ao seu lado o Padre Manoel, então Prefeito de São Domingos, seu correligionário e amigo, que lhe daria a hóstia da comunhão.)

O pavio do estopim que dividiu para sempre os cristãos católicos do Ocidente e os do Oriente foi a definição do Vaticano pela língua oficial. Roma impôs o Latim. Os cristãos católicos não queriam desprezar o grego e o hebraico.

A raiz cristã católica é a mesma. As Igrejas é que são diferentes – a Católica Apostólica Romana e a Católica Ortodoxa predominante na Rússia, na Grécia e com presença forte em dezenas de países.

O chamado Cisma do Oriente só confirmou a grande sacada tropicalista tirada do Apocalipse, Atos 2:3 – “E línguas como que de fogo tornaram-se invisíveis. E se distribuíram e sobre cada um deles assentou-se uma. E todos eles ficaram cheios de espírito santo e principiaram a falar em línguas diferentes.” (Gilberto Gil, Objeto Simi-Identificado,  gravadora Phillips, 1969).

(Edson Vidigal, Advogado, foi Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal)

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